No primeiro artigo comentei sobre o choque inicial da pandemia, e no segundo artigo trouxe algumas ideias para começar a adaptar as empresas à nova realidade, seja ela qual for. Agora vou falar um pouco sobre a Retomada, o momento em que as restrições físicas começam a desaparecer e o mercado começa a voltar a seu ritmo de funcionamento em um terreno novo e ainda incerto. Pretendo também indicar um conjunto de ações emergenciais para focar na sobrevivência e retomada de empresas altamente impactadas pela pandemia.
Uma visão aterradora
Ademais do impacto em vidas, extremamente trágico por si só, a pandemia já causou um estrago enorme nos mercados ao redor do mundo. Empresas tradicionalmente sólidas, em mercados tidos como seguros já decretaram falência, se somando a uma lista ainda crescente de marcas devastadas pelos efeitos negativos da crise. Este estudo da Bloomberg News ilustra essa terrível realidade. Desde marcas menos conhecidas até tradicionais gigantes como Hertz, Latam Airlines ou JC Penney. A forma como a pandemia impactou mercados de todos os tipos pode ser facilmente vista nesse gráfico.
Esse gráfico é uma visão aterradora da realidade atual, considerando que ainda devem haver muitas novas empresas a serem adicionadas nos próximos meses, em todos os países.
Isso nos mostra que estamos em modo “sobrevivência” aqui. O objetivo mais comum não é ganhar mercados ou multiplicar ganhos, mas unicamente sobreviver o suficiente para a empresa estar operacional quando o ritmo do mercado voltar a aumentar.
Sendo assim, seguem algumas ações práticas para o cenário de sobrevivência em que estamos. Claro que estas ações devem ser tomadas como inspiração somente, e dependendo de sua realidade específica precisam de ajustes, mas trazem um toque de centralização no cliente que certamente será um diferencial a ser usado mesmo após a retomada emergencial.
Plano de sobrevivência e retomada
Ok o cenário aproximado é este - sua empresa perdeu clientes, teve que demitir uma boa parte dos funcionários, clientes existentes estão com problemas de caixa também e fornecedores idem. A operação aumentou custos relacionados a isolamento social e higienização. Novas formas de interação com o mercado tiveram que ser implementadas ou fomentadas, como whatsapp, delivery, marketing digital etc. E no fim as contas não fecham.
1.Analise sua própria empresa
O primeiro passo é analisar a fundo a própria empresa. Custos, rentabilidade, crescimento (mesmo que negativo), churn e quaisquer outras métricas e indicadores que você já usava. Não basta saber que “perdi clientes”, mas quantos exatamente, de quais mercados, com qual receita?
Revisite sua estratégia, quais aspectos dela foram mais afetados, quais aspectos podem até ser diferenciais na nova realidade. Quais produtos ou serviços entregues por sua organização sofreram menos? Para quais mercados? Existe algum aspecto de sua entrega que se valorizou nesta nova realidade? Mas principalmente, lembre de seu propósito. Porque a empresa existe mesmo? Qual a dor que ela resolve? Qual a entrega básica que seu cliente sempre esperou de você?
Por fim, mas não menos importante, olhe para sua cultura interna, como ela está sendo afetada pela crise. E a experiência do colaborador, como fazer com que mesmo nesta época ela siga positiva e sintonizada com o propósito de todos? Abra portas de diálogo interno, entenda os pontos de dor de cada pessoa, cada função.
Durante as crises é que as culturas são fortalecidas, então aproveite para incutir em sua cultura valores fortes e alinhados a sua sobrevivência.
2. Analise o mercado
Olhe agora para fora. O que mudou? O propósito de sua empresa continua válido? O que houve com seus concorrentes diretos, que possa te ajudar a perceber o que está funcionando e o que não serve mais?
Entenda como o mercado está mudando. Se há tendências novas ou alterações que impactem de alguma forma seu modelo de negócios. Como o delivery se encaixa na equação de sua empresa agora? Como o isolamento social e preocupações com saúde forçam mudanças?
3. Comece a encaixar as coisas
Agora que você já mapeou numericamente sua empresa, identifique seus top 20% de clientes mais lucrativos. Não necessariamente os que te dão mais receita, mas considerando seus custos de servir, os que têm maior lucratividade.
Se o Princípio de Pareto seguir válido, eles responderão por 80% de seu lucro. Eles são seu ouro, que você deve cuidar e resguardar neste momento delicado de mercado. Eles serão o embrião do modelo de negócios que você deverá evoluir no pós-pandemia.
Passe a entender melhor este grupo, e principalmente como sua empresa se localiza na sobrevivência deles, e até como seu propósito se encaixa nesse grupo de clientes. Passe então a mapear a jornada desses clientes. Entenda como sua entrega interfere nessas jornadas e quais pontos poderiam melhorar. Como você está focando agora em 20% dos clientes, pode entender mais detalhadamente as jornadas e até perguntar especificamente a estes clientes o que sua empresa pode fazer para melhorar ainda mais sua entrega.
4. Medições são fundamentais
Aqui quero dizer colocar medições em pontos específicos das jornadas para monitorar seu fluxo, percepções dos clientes e resultados de negócio. Lembre que sempre é importante medir “quantidades” e “qualidades”. Por ex, se a quantidade de vendas aumentou, veja se a qualidade esperada não sofreu por causa disso. Se o NPS está bom, será que não há poucas respostas e pode ser um resultado ilusório?
Também importante atentar para a forma correta de medição. Se a cada transação você está perguntando pelo NPS, no fundo você não está medindo poder de recomendação mas sim satisfação pontual (o que ainda é bom, mas não indica muito bem que haverá recomendação, tanto quanto indicará que haverá recompra). Se o CES é medido no meio (e não no final) de um processo importante, você não capturou todo o potencial de simplificação, etc.
Uma vez tendo medições estruturadas corretamente, gradualmente você terá mais dados e poderá passar a fazer correlações, e aí começam a aparecer insights estratégicos.
Você começará a entender o quanto uma melhoria de effort score (CES) implica em aumento de taxa de retenção, ou quantos pontos de variação de NPS significam em aumento de market share etc. Também tendo medições em suas jornadas, poderá detectar continuamente quais pontos das jornadas precisam melhorar.
5. Orientação de Investimentos
Invista nessas melhorias, e reduza custos em tudo o que não sustentar estas jornadas dos clientes mais lucrativos. Não se trata de desprezar o restante dos clientes, mas de priorizar investimentos de maneira a propositalmente evoluir o que mais importa aos 20% mais lucrativos. Essas melhorias irão afetar os demais clientes também, mas não necessariamente nos aspectos que eles mais valorizam.
Para o grupo dos mais lucrativos será diferente, eles sentirão as melhorias exatamente no que lhes faz valorizar mais sua marca, e aparecerá uma tendência de expansão deste tipo de cliente. Justamente o tipo mais lucrativo. Boca-a-boca, indicação, adequação ao mercado-alvo tudo isso funcionará em ciclos positivos de entrega de valor, e você terá construído um primeiro ciclo de retomada de negócios, agora moldado para o que era seu 20% de clientes mais lucrativos.
Resumindo
No modo sobrevivência você simplesmente identificou as características dos clientes mais adequados e lucrativos a seu business, e reorientou sua empresa a operar pensando neles em todos os aspectos. E o crescimento de sua organização usará este novo modelo para expansão, agora muito mais centrada no cliente, e no cliente mais lucrativo.
Francisco Zapata
Head of Customer Experience
zapata@rokkets.digital
Francisco Zapata é Especialista em Customer Experience, Certificado como CCXP (Certified Customer Experience Professional) pela CXPA (Customer Experience Professionals Association), Especialista em Atendimento e palestrante em Português, Inglês e Espanhol. Zapata é Head de CX da Rokkets e tem o objetivo de ajudar organizações a evoluírem sua Centricidade no Cliente através de diversas estratégias, tecnologias e métodos altamente eficazes.
Comments